domingo, 28 de novembro de 2010

DE QUE SERVE O TEXTO?


Houve um tempo em que o fazer filosófico estava limitado à oralidade, que o diga, Sócrates (ou Platão e a descrição dos diálogos mantidos pelo seu mestre), mas com o tempo essa primazia no modo de filosofar foi dando lugar a palavra escrita. De modo que, hoje em dia, o homem também manifesta seu pensamento e democratiza seus conhecimentos, teóricos ou empíricos por meio de textos. Além de que, é claro, esse homem deixa conhecer a si mesmo quando escreve, uma vez que, aquilo que se expõe não pode ser desprovido de intencionalidade, ou abster-se das marcas pessoais relativas à experiência de vida do próprio escritor. Em todos os casos, o texto constitui-se em uma ferramenta intrínseca de conhecimento. Ressalta-se, pois, o seu valor, em todas as modalidades: desde os produzidos a simples papel e caneta aos publicados na web por meio de editores de textos; sendo que, ao todo, concretizam um tipo de saber que um discurso oral não poderia abarcar - tamanha a importância que o texto tem para o homem de hoje: tanto no ato de escrever quanto no de ler.  Suponhamos que  Machado de Assis tivesse que deixar todo seu legado intelectual (que efetivamente construiu com suas obras literárias) verbalizado em praça pública, ou obras colossais como: a Ilíada e Odisséia de Homero e Dom Quixote de Miguel de Cervantes produzidas (desferidas) num discurso integral. Quem daria ouvidos? Seriam palavras lançadas ao vento, não seriam? Isso, sem mencionar os textos técnicos, poéticos,  teóricos e muitos outros. Em suma, o texto é um registro documental de conhecimento, e embora haja julgamentos de valor sobre ele, apenas isso, já é o bastante para validá-lo. Digamos que correm em paralelo dois eixos de onde pode descender o saber: de um lado as ações humanas e a comunicação oral ou gestual que as intermedia, de outro, os textos produzidos pelos homens. Assim, podemos postular o seguinte: aqueles que auto-decretam “eu não gosto de ler”, "ler me dá sono" ou "não tenho tempo pra leitura" seriam pessoas que decidiram conscientemente conhecer só a metade do que poderiam. Pois, desta maneira, colocaram-se à parte de um montante de conhecimento só possível por meio de texto escrito.

sábado, 20 de novembro de 2010

A CONSCIÊNCIA É NEGRA?

Quando falamos em consciência negra naturalmente nos referimos à reflexão sobre a inserção dos negros na sociedade brasileira e à sensibilização promovida e apoiada na lembrança de um período, no qual o negro fora explorado e injustiçado inescrupulosamente, ou seja,  a época em que os negros foram feitos escravos. Mas também, queremos trazer à tona um sentimento e uma atitude de humanização entre todas as raças de modo a sobrepujar o preconceito existente ainda hoje. Por outro lado, falar em consciência, inevitavelmente leva a campos complexos e mais profundos, tais como a filosofia. Kant, por exemplo, associou a consciência à ética, dizendo que esta é baseada no fato do homem, a si mesmo se impor um norma, um dever  a ser cumprido por ele, e a isso chamou de "imperativo categórico". Ora, se o ego humano busca necessariamente as vantagens do ego, como o homem não haveria de revogar os deveres que a si mesmo se impôs? Dessa forma, o homem violaria qualquer código ético a fim de, legitimamente proteger seus interesses, não é mesmo? Entretanto, o filósofo alemão postulou que essa ética não seria propriamente ego-imposta mas teo-imposta, isto é, ela seria uma voz divina que emerge da consciência humana. De modo, que se assim não fosse, como se explicaria as vezes em que entramos em conflito e dizemos "estou com a consciência pesada, depois de ter feito tal coisa"? Kant, tambem disse que quando tivermos dúvidas quanto à licitude de nossas práticas seria útil perguntarmos se essa ou aquela ação isolada poderia ser convertida em lei universal, caso a resposta seja positiva, estaríamos eticamente resguardados. Enfim, essa mesma ética racional é que deveria nortear nossas ações em todo tempo, já que ela é inata, e para que a consciência seja de fato humana e humanizada há de se incluir , além de negros, toda e qualquer minoria  eventualmente vitimada por discriminação. Talvez a consciência, nesse sentido, não deva ser negra, antes, totalizadora, integral, ou ainda, multicor, significando que devemos estendê-la a todos os aspectos da vida social.

PS: Esse meu texto foi adaptado e publicado em livro de crônicas, sob demanda de Valdeck Almeida.

domingo, 14 de novembro de 2010

O QUE É SOBRENATURAL?

Na Antiguidade, o homem atribuía ao sobrenatural toda sorte de fenômenos, aos quais não sabia explicar ou dar uma causa lógica, isto é, para os eventos que transpunham o saber humano da época, este homem criava um mito. O mito era passado de geração à geração com a importante função de ocupar uma lacuna do conhecimento. Dessa forma, o fenômeno da chuva já foi tido como algo sobrenatural. Afirmava-se por exemplo: "os anões roubaram o martelo de Thor outra vez. Rezemos para que o deus Thor acumule forças e recupere seu poderoso martelo, antes que as chuvas destruam nossas plantações". Assim foi, até que alguns, como Tales de Mileto (um dos primeiros filósofos que temos notícia), ousaram questionar, buscando respostas mais convincentes para as transformações do mundo natural. Isso foi o precedente de toda a Ciência. E, a partir dela, muitos mitos como esse foram sendo deixados para trás. Por outro lado, o homem de hoje, ainda se depara com fatos e coisas, às quais não consegue explicar racionalmente, e a esses eventos imputa-lhe o título de "sobrenatural".


De certo, são muitos os nomes: psicografia, telepatia, necromancia, levitação, adivinhação, paranormalidade e muito mais, que misturados a sonhos, acontecimentos casuais e coincidências, são postos em conjecturas como "experiência do além" ou "obra dos anjos". Diante disso, perguntamos: "o que é sobrenatural?" Podemos classificar tais coisas desse modo só porque o entendimento humano ainda (isso mesmo, AINDA) não as alcançaram? Pois, como vimos, em tempo, os avanços científicos podem trazer à luz fenômenos, outrora, extraordinários. Não seria ultrapassado demais fazermos tal classificação só por não termos as respostas logicamente estruturadas? E, por último, quem disse que os homens dominam ou são conhecedores de todas as leis da natureza? Já que não nos damos conta disso, se Tales pudesse olhar para o homem moderno, certamente diria: - o mito persiste.

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

TUDO SE RECICLA?

Muitas religiões do mundo se baseiam na existência de uma "alma imortal" para responder a questão: o que acontece após a morte?  Só esse questionamento em si já carrega implícito a necessidade e/ou desejo inconsciente do homem de não desaparecer.  Talvez ela seja a resposta para aquilo que está a nos definir enquanto seres humanos, já que, como vimos, é muito mais que características individuais, conjunto de genes, cérebro, etc., ou seja, é algo que está para além da física (leia o post: O QUE DISTINGUE AS PESSOAS....? Ao supor e nomear, então, esse "algo" de alma, algumas religiões consideram que quando o homem morre, essa alma eterna ficaria disponível para habitar um novo indivíduo, isto é, reencarnar; e há crenças que sugerem que ela possa habitar outra espécie de ser, como um coelho ou uma árvore, e ainda, "voltar" várias vezes até alcançar um estado elevado. Sabendo-se que, por dia, nascem e morrem milhares de pessoas no mundo, cabe a pergunta: em que momento o "inventor de almas" parou de emitir novas unidades e resolveu reciclá-las?  Teria sido ainda na época dos homens das cavernas? a partir dos 8 integrantes da família de Noé? ou depois da Segunda Guerra Mundial? Seja como for, parece que a conta não bate. Agora, deixando a questão religiosa de lado, e tratando o tema apenas no âmbito da razão, o que temos é que após a morte, ao contrário do que se pode cogitar, o corpo (ou a matéria) com o passar do tempo, apodrece, sofrendo transformações químicas, contudo ela não desaparece. Ainda que as moléculas se desintegrem, o fato, é que os átomos que compunham aquele indivíduo continuam a existir e tornam a ficar disponíveis na natureza, de modo que, agrupando-se a outros, vão fazer parte de um novo ser, desde um lírio, a uma formiga ou um rinoceronte, certo?  Dado que os "pedacinhos" do morto continuam a existir de outras formas, e a re-clicar indefinidamente, poderíamos dizer que aí, sim, reside o re-encarnar?

sábado, 6 de novembro de 2010

PÍLULA DO DIA SEGUINTE PREVINE GRAVIDEZ (E MATA O EMBRIÃO)?

A pílula do dia seguinte é mais uma engenhosidade humana para o alívio dos conflitos que a própria humanidade concebe. Ops! “conceber” não parece um termo adequado para o assunto em questão, já que o tal medicamento alivia o fardo de uma possível gravidez indesejada. Porquanto, se existirem todas as condições apropriadas, os espermatozóides, após adentrarem a genitália da mulher, saem em disparada ao encontro do óvulo e o fecundam imediatamente. A pergunta é: quem faz uso dessa pílula pode estar cometendo um 'aborto legal'? Pois o paradoxo é muito claro: um método "pré-conceptivo" que é "pós-aplicado".

Pelo visto, nos posicionarmos a cerca do aborto não é tão simples assim. A consciência dos envolvidos no coito desprotegido talvez repouse no fato de não saberem se há um embrião formado até o fim das 24 horas subsequentes ao ato sexual, não é mesmo?  Mas, e se houver? Matar e expelir um embrião que tenha sido formado  há apenas algumas horas não tem problema. Ou tem? Quantos são os que consideram que a vida começa no momento da fecundação? Os médicos garantem que um embrião recém-formado sequer tem um coração. Mas quem pode afirmar qual seria o "instante-já" da vida? A medicina  ou aquele casal que colocou essa possibilidade em curso? Então, quando é que a vida começa?  Seria com duas semanas de gestação?   apenas quando os primeiros sintomas de gravidez são percebidos? somente com o nascimento? A resposta parece não ser fácil. Mesmo assim, nossa concepção sobre quando a vida se inicia vai determinar o que estamos fazendo ao utilizarmos a pílula engenhosa (ou outros métodos de "prevenção").

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

O QUE DISTINGUE AS PESSOAS UMAS DAS OUTRAS (E DE OUTROS SERES)?

A ciência demonstrou, no últimos anos, por meio do mapeamento de DNA e o sequenciamento de genoma que a espécie humana é menos diferente das outras espécies do que se imaginava. Ao que tudo indica, a composição dos genes no homem é tão complexa quanto em uma mosca da fruta. Diante disso, proponho nos perguntarmos: “Como posso postular que sou um ser distinto e único?”

Numa resposta apressada poderíamos dizer que as características de cada ser é responsável por essa diferenciação. Mas nessa macroanálise, que características estariam sendo levadas em consideração? A forma física? Isso seria muito simplório para nos definir. Exceto se assumirmos que somos simplesmente, individualmete, um corpo –  em cada detalhe – seus membros, seus órgãos, seu peso, sua altura, seu formato, sua cor. Não adianta. De qualquer forma, isso não é o suficiente. Em essência, tudo, ou toda matéria, não passa de um emaranhado de átomos, certo? Uma combinação magnífica desses elementos químicos - eternos e imutáveis, como intuíra Demócrito. É Incrível como um número limitado de elementos pode dar origem a uma infinidade de seres e coisas. Desse modo, até o cérebro humano é “igual”. A propósito, como é possível, a partir dos átomos que compõem meu cérebro, eu sonhar, lembrar, imaginar ou esquecer?  Uma borboleta que hoje voa livremente pode lembrar-se que  um dia já foi larva? É possível? A ciência nos ensinou que somos os únicos seres racionais. Então, a resposta óbvia é não. Mas o resto ela não diz (ou não consegue dizer): a capacidade de lembrar é própria dos átomos que se agruparam para formar o cérebro humano? Não poderia. Um átomo de carbono vai ser sempre um átomo de carbono - em mim ou em qualquer outro ser.  Então, o que é a racionalidade e onde ela reside? no corpo? nos genes? ou na alma? Pelo visto, parece haver algo mais nos distinguindo como seres.